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Mahalia e Canela da Ponta da Pinta
 
Uma raça,
duas variedades

Cão da Serra da Estrela

A popularidade crescente que o Cão da Serra da Estrela atingiu em Portugal a partir do último quartel do século XX tornou-o, entre nós, a mais conhecida e procuradas das raças portuguesas. No entanto, muitas pessoas pouco informadas desconhecem que existem duas variedades, a de pêlo comprido e a de pêlo curto. A primeira disseminou-se pelo país e também fora de portas, sobretudo através do trabalho de criadores, sendo muito utilizada como cão de guarda de propriedades mas também como animal de companhia; a segunda, menos divulgada, é a preferida pelos pastores para o desempenho da função original na protecção de rebanhos (o pêlo mais curto é de mais fácil manutenção), mas a sua baixa popularidade e número do efectivo mantêm-na como variedade em risco.

 

Desenvolvidas separadamente desde os primórdios da canicultura em Portugal, para funções distintas, com diferenças assinaláveis em aspectos morfológicos importantes (como demonstrou o estudo da Dra. Carla Cruz “As raças portuguesas de cães de gado e de pastoreio - aspectos morfológicos e comportamentais"), poder-se-ia pensar tratar-se de raças diferentes, ou pelo menos de variedades não autorizadas a acasalar entre si para efeitos de registo no livro de origens. Não é o caso. Apesar do Clube Português de Canicultura permitir, mediante pedido fundamentado, o cruzamento das duas variedades, poucos são os criadores (e todos eles da variedade de pêlo curto) que têm utilizado essa ferramenta útil para o beneficiamento da raça. No entanto, os benefícios desse “outcrossing” são vários, para ambas as variedades, e incluem o melhoramento do tipo, do carácter, das aptidões de trabalho, da saúde e a preservação da diversidade genética, fundamental numa raça que sempre foi rústica, robusta, apta para a sobrevivência em condições adversas e em ambiente natural, com um mínimo de intervenção humana. O mito do “meio-pêlo”, inventado no século passado e alusivo a um eventual híbrido entre as duas variedades, é um pressuposto empírico destituído de fundamento técnico (como bem o sabem todos os que possuem noções elementares de genética), não devendo, por isso, constituir obstáculo a essa estratégia de melhoramento da raça.

 

Pela primeira vez, a Ponta da Pinta, que desde 2002 se tem dedicado à criação de Cães da Serra da Estrela de pêlo comprido, espera concretizar, com a sua próxima ninhada, o seu projecto antigo de beneficiamento bilateral usando como padreador um cão da variedade de pêlo curto oriundo de linhagens de trabalho. Por se tratar de um exemplar heterozigótico (portador da cópia de gene, ou alelo, que determina o pêlo comprido), a ninhada deverá ter cachorros de ambas as variedades, sendo que os de pêlo comprido só poderão gerar prole dessa variedade (a menos que acasalados com exemplares de pêlo curto) e os de pêlo curto serão, como o pai, portadores de alelos do pêlo comprido, pelo que poderão ter filhos de ambas as variedades, dependendo dos acasalamentos. Este “outcrossing” de dois excelentes exemplares (a nossa cadela Babilónia da Ponta da Pinta e o macho de pêlo curto Duque da Casa de São Francisco) constitui mais um contributo da Ponta da Pinta para o melhoramento da raça, neste caso de ambas as variedades.

 

Novembro de 2014

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